quarta-feira, maio 07, 2014

indielisboa' 14: Refúgio e Evasão

Na secção Director's Cut Luís Alves de Matos apresentou o documentário Refúgio e Evasão (2014), título que nos remonta para Alberto Seixas Santos, enquanto jovem, bem como para os factores determinantes que o conduziam até à sala de cinema. A sala era, para ele, refúgio, um sítio onde me podia acolher, e evasão, que ao mesmo tempo podia abrir horizontes, abrir espaços, espaços que existiam em volume numa tela sem volume. Seria esse o fascínio.

Num documentário que se debruça sobre a vida e obra, mas, mais do isso, sobre a percepção do cinema - do que é, do que já não mais é, do que, ainda assim, foi - de Alberto Seixas Santos, Luís Alves de Matos traz-nos um homem para quem o cinema representa já memória. Através da montagem de monólogos de Seixas Santos face a face com o espectador (câmara) , em cenário negro, e de imagens dos seus filmes- os que conhecem a sua assinatura , Brandos Costumes (1975) e Gestos e Fragmentos (1983) e aqueles que marcaram a sua vida - vemos o realizador e crítico, intimamente ligado ao movimento do Cinema Novo conhecido em Portugal a partir da década de 60, desconstruir o cinema, num ataque frontal a tudo quanto hoje se faz. Já não vai ao cinema porque já não lhe interessa, não o cinema, mas o cinema de hoje e, quando cai na tentação de ver um filme ao qual os nossos críticos atribuem várias estrelas, apercebe-se de que foi um erro. Aqui, aponta um grande culpado: o audiovisual. De resto, para tal Bresson já havia alertado. Quando questionado sobre se pessimista ou optimista em relação ao futuro do cinema, terá respondido 'Pesssista. Por causa da palavra audiovisual'.

O que resta? Relembrar, em acto de desistência e saudade, todos os que marcaram. Rosselini, Dreyer, Lang, Renoir, Bresson, Straub vivem ali. Todos os que marcaram Seixas Santos, todos os que marcaram o cinema. E só assim o é por um motivo: o risco. Só as obras que correm riscos ficam, tudo o resto perece. Renoir construiu, Bresson desconstruiu, todos correram sérios riscos e assumiram-nos até ao fim. Poder-se-ia dizer que Seixas Santos corre o risco ao anunciar em tom grave o fim de um período onde efectivamente se criou, o que não será mais do que anunciar o fim do cinema assim como ele o conheceu, assim como o considera. Pelo seu tom assertivo, contudo, o risco na afirmação não aparenta ser grave.


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